O suposto envolvimento da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, na
produção do chamado "dossiê anti-FHC", continua acirrando a
queda-de-braço travada entre governo e oposição no caso dos cartões
corporativos. Depois que a oposição conseguiu, no início da tarde de
hoje (15), aprovar um requerimento de convocação para a ministra, foi
realizada uma reunião de líderes de última hora, na presidência do
Senado, em que "absolutamente nada" ficou decidido sobre a questão,
segundo o senador Demóstenes Torres (DEM-GO). Mas os governistas já
avisaram: vão usar o regimento para impedir a vinda de Dilma para
tratar de dossiê com os senadores.
Com duas comissões criadas para tratar do assunto (a mista, de
deputados e senadores, já em funcionamento), agora outro fórum – a
Comissão de Infra-Estrutura (CI) do Senado – vira palco do embate.
Depois de ver o requerimento aprovado na CI, o líder do governo no
Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), já avisou que também vai apresentar um
requerimento de recurso à CI e outro ao plenário, ambos com mesmo teor,
com o objetivo de impedir que a ministra fale sobre um tema que não diz
respeito ao colegiado – o que, segundo ele, fere o regimento do Senado.
Ao deixar a reunião de líderes, o presidente da CI, Marconi Perillo
(PSDB-GO), confirmou que Dilma continua convocada, e que, em relação à
aprovação do requerimento, "tudo foi feito obedecendo ao regimento e à
Constituição Federal". "Tomei a decisão [de levar à votação o
requerimento, que foi apresentado pelo tucano Mário Couto, do Pará] com
base nas informações técnicas da comissão. As pessoas que atuam na
comissão são excelentes regimentalistas."
Mais cedo, Mário Couto disse ao Congresso em Foco que a aprovação do
requerimento ocorreu dentro das conformidades regimentais e
constitucionais. Segundo o tucano, integrantes governistas da comissão
chegaram para a sessão de hoje, assinaram presença e se ausentaram.
Para ele, foi esse novo "cochilo" que permitiu a aprovação, uma vez que
a maioria dos senadores presentes à reunião era oposicionista. "Camarão
que dorme a maré leva", ironizou (leia).
"A ministra continua convocada a prestar três esclarecimentos em três
audiências públicas", sentenciou Perillo, advertindo que, "em hipótese
alguma, a maioria [governista] nesta Casa vai passar por cima da
autoridade do presidente da Comissão de Infra-Estrutura". "Podem passar
o rolo compressor em outras comissões. Na comissão que eu presido, não.
Lá nós vamos observar sempre o regimento e a Constituição", bradou o
senador goiano.
Por que não?
O senador Demóstenes Torres não vê razão para a ministra se negar a
prestar esclarecimentos no Senado. Ao sair da reunião, ele disse à
imprensa que o governo vai usar todos os recursos para impedir a
"visita" da ministra. "É uma recusa imotivada; por que não vir ao
Senado, que tem a legítima representação popular, pra falar sobre
isso?", disse o democrata.
Em relação ao assunto a ser explorado junto à ministra, Demóstenes foi
taxativo. "Convenhamos: a ministra não tem que optar [pelo assunto a
ser tratado], pesa sobre ela a acusação de que ela confeccionou um
dossiê, e que esse dossiê foi vazado a partir da Casa Civil. Então, ela
tem de falar."
Entretanto, Demóstenes sabe que o governo, que só aceita abordagem do
tema Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), não vai ceder
facilmente à pressão oposicionista. "Eu acho que eles vão tentar de
toda forma [impedir a ida de Dilma. A líder [do PT no Senado, Ideli
Salvatti, SC], disse que o governo, na realidade não queria que a
ministra Dilma viesse convocada. Nós propomos que a ministra venha
convidada, mas ela vai falar sobre o dossiê, porque inclusive ela já
falou à imprensa sobre isso", argumentou o senador.
Desvio de foco
O líder Romero Jucá justificou o porquê de sua objeção à ida de Dilma à
CI para falar sobre dossiê. "Entendemos que a convocação, da forma como
foi feita, não é tema da Comissão de Infra-Estrutura", disse, lembrando
que Marconi Perillo não pôs o recurso apresentado por ele em votação.
"Vamos cobrar que, na quinta-feira [17], vote-se esse recurso. Nós
entendemos que isso deve ser discutido e resolvido no âmbito da própria
comissão."
Jucá reafirmou que a ministra Dilma irá à CI "debater e discutir PAC",
o que, segundo ele, seria inclusive a posição da própria Dilma, bem
como, obviamente, do próprio Planalto. "Qualquer outro assunto não é
tema da Comissão de Infra-Estrutura. Se a ministra for perguntada, ela
responde se quiser", concluiu Jucá, alegando o desvio de foco dos
assuntos da comissão.
"A reunião de hoje da Comissão foi para votar autoridades, foi votado
um dirigente da ANTT [Agência Nacional de Transportes Terrestres]. A
base do governo foi pra lá discutir isso, não foi para discutir
requerimento de CPMI", reclamou Jucá, referindo-se à aprovação do
engenheiro Mário Rodrigues Júnior para a diretoria da autarquia
especial vinculada ao Ministério dos Transportes. (Fábio Góis)
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