Eduardo Militão
A Justiça determinou que seja extinta a Associação para Projetos de
Combate à Fome (Ágora), ONG de Mauro Dutra, amigo do presidente Lula. O
juiz Aiston Henrique de Sousa, da 6ª Vara Cível de Brasília, tomou a
decisão terça-feira (6), numa ação de dissolução de sociedade proposta
pelo Ministério Público do Distrito Federal (MPDF). A entidade também
foi responsabilizada pelo sumiço de R$ 1 milhão do Ministério do
Trabalho, caso que lhe rendeu um procedimento administrativo na
Procuradoria da República no Distrito Federal.
Segundo os promotores do MPDF, a Ágora descumpriu a legislação do
terceiro setor ao remunerar seus diretores, emitir R$ 887 mil em notas
fiscais frias e fugir de seus objetivos estatutários. O objetivo da
entidade era apenas promover estudos e projetos para combater a fome
até 1997.
Naquele ano, a ONG passou a fazer capacitação profissional ao fechar
contratos de R$ 4,6 milhões com a Secretaria de Trabalho do Distrito
Federal, segundo os autores da ação, os promotores Lenilson Ferreira
Morgado e Thiago André de Ávila.
Eles denunciaram à Justiça que os dirigentes da entidade, entre eles
Mauro Dutra, fizeram manobras jurídicas para contratar com o poder
público sem licitação e obter isenções tributárias, mesmo sem atender o
requisito de não remunerar os sócios.
De acordo com a denúncia do MPDF, os diretores delegaram poderes de
administração da ONG a pessoas que, supostamente, deixaram a direção da
entidade. E essas pessoas, por meio de suas empresas, faziam negócios
com a Ágora. Por trás desses repasses, sustentam os promotores, estaria
uma forma disfarçada de remuneração dos diretores da entidade.
Por fim, uma auditoria da Secretaria de Fazenda do DF constatou que 31
empresas inexistentes receberam R$ 887 mil da Ágora por meio de notas
"frias". "Tais irregularidades [...] demonstram a total falta de
compromisso dos dirigentes da Ágora na administração da entidade,
permitindo que ela fosse utilizada apenas para atender interesses
particulares."
Em 2005, a 12ª Vara Cível de Brasília já havia condenado Mauro Dutra a
devolver R$ 887 mil à Ágora como ressarcimento.
Sem providências
Segundo a decisão proferida anteontem, os diretores da Ágora
argumentaram que a entidade não existe mais e que a ação teria perdido
o objetivo. Mas o juiz Ailton Sousa não entendeu assim: "Os atos
necessários a exaurir a extinção não foram ainda realizados, pois não
foi demonstrada a realização das providencias necessárias à baixa no
registro das pessoas jurídicas", disse ele, na sentença.
A defesa da Ágora ainda tentou alegar que o MP não tinha competência
para pedir a extinção da entidade. O pedido também foi negado pelo juiz.
Portas baixadas
A assessoria de Mauro Dutra informou que a Justiça apenas atendeu a um
pedido da entidade para que ela fosse extinta, conforme decidido em uma
assembléia em 9 de maio do ano passado. "A Ágora deixou de existir
porque quis. Agora, ela acabou." O patrimônio da ONG, computadores e
mesas, foi doado a uma creche.
Quanto à condenação de R$ 887 mil, a assessoria alegou que o juiz
condenou Mauro Dutra sem ouvir sua defesa. Quando o advogado foi
protocolar o documento, o cartório da Justiça estava em reforma.
Segundo a assessoria, mesmo assim, o juiz não considerou que o prazo
para explicações deveria ser dilatado.
Prestação de contas
Em 2005, a pedido do Tribunal de Contas da União (TCU), o Ministério do
Trabalho (MTE) passou a cobrar R$ 1 milhão de da ONG por não prestar
contas dos valores recebidos para treinar jovens no programa Consórcio
Social da Juventude. Ao todo, a entidade recebeu R$ 7,68 milhões.
Além do registro da entidade no Cadastro dos Inadimplentes (Cadin), o
problema rendeu um processo administrativo contra a ONG na Procuradoria
da República do Distrito Federal.
Por conta da cobrança, a Ágora entrou com um mandado de segurança
contra o presidente da Comissão de Tomada de Contas do Ministério do
Trabalho. Em março passado, a 9ª Vara Federal Brasília concedeu uma
sentença favorável à entidade, mas informou à assessoria da Justiça
Federal que não poderia divulgar o conteúdo da decisão e o reflexo dela
no caso.
A assessoria da Ágora não tinha detalhes sobre o caso, mas afirmou que
o mandado de segurança questiona a negativa do governo em aceitar
prestação de contas do dinheiro que incluía gastos sem nota fiscal.
"Tem gente que não tem nota fiscal e nem CPF", justificou. "Fica um
buraco na prestação de contas."
O mesmo repasse do Ministério do Trabalho à Ágora incluiu R$ 335.854,00
liberados irregularmente à entidade por ferirem a Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO). A ONG está em ums lista de 45 entidades que
receberam R$ 17 milhões do ministério, como revelou o Congresso em Foco.
No ano passado, o promotor de Justiça de Fundações e Entidades de
Interesses Sociais do MPDF, Gladaniel Palmeira de Carvalho, defendeu
que os senadores da CPI das ONGs quebrassem o sigilo da entidade para
investigar irregularidades. "Sem essa quebra, a investigação não ficará
totalmente esclarecida", disse ele, à época.
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