Soraia Costa
Apesar de aprovada por unanimidade pelo Congresso, a lei que cria o
Sistema Nacional de Mobilização (Sinamob) e estabelece as diretrizes
sobre como o país deve reagir a "agressões estrangeiras" não está imune
a críticas. Doutor em Direito Constitucional, Cristiano Paixão vê na
nova norma um "endurecimento" da política nacional de segurança.
"É bastante discutível a necessidade desse dispositivo. A Constituição
não reclama regulamentação específica neste ponto, e o país não está
inserido numa situação, no plano internacional, que aponte para a
possibilidade de mobilização", defende o professor da Universidade de
Brasília (UnB).
Para o professor, a nova lei (veja a íntegra) pode ameaçar o direito
constitucional da privacidade. "A lei é visivelmente negativa. Ela se
insere num contexto internacional de endurecimento da política de
segurança de vários países após os atentados de 11 de setembro de 2001.
É particularmente preocupante a possibilidade de requisição de
informações de entidades e de pessoas 'com prioridade absoluta'. Toda e
qualquer requisição de informações deverá observar o princípio
constitucional do direito à privacidade", diz ele.
"Além disso, a menção a ações de mobilização em períodos de normalidade
não é convincente, e extrapola o próprio escopo do texto
constitucional", acrescenta.
Informações necessárias
Integrante da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, o
senador Cristovam Buarque (PDT-DF) também se mostra preocupado com o
artigo 8° da lei que estabelece que "o Sinamob poderá requerer dos
órgãos e entidades dos estados, do Distrito Federal e dos municípios e
de pessoas ou de outras entidades as informações necessárias às suas
atividades".
O mesmo artigo traz, ainda, um parágrafo único que acrescenta: "Na
execução da mobilização nacional, as requisições referidas no caput
deste artigo terão prioridade absoluta no seu atendimento pelos órgãos,
pessoas e entidades requeridos".
"Esse artigo parece preocupar porque fala da exigência de se prestar
informações. Mas imagino que não se trata de informações pessoais e sim
de dados técnicos", avalia o senador pedetista.
Negando que haja "armadilhas" na lei, o tenente-coronel da reserva do
Exército Paulo Kuhlmann, doutor em Ciência Política, argumenta que "se
o Estado não pode compulsar cidadãos e estruturas para a Defesa, em
caso de agressão, perde ele a base principal do conceito de soberania,
que justifica a sua existência".
Para ele, em uma guerra pode ocorrer diminuição das liberdades
individuais, tal como em situações extremas do estado de sítio, mas
isso não significa uma afronta à democracia. "Os conceitos de
cidadania, tal como conhecidos (política, civil e social) acabam por se
chocar levemente em alguns casos, cabendo ao Estado legislar e cuidar
de quando e como haverá a prevalência de um sobre o outro", defende.
Política de preservação
O diretor do Departamento de Mobilização Nacional, do Ministério da
Defesa, general Luiz Sodré, também faz questão de enfatizar que a
implantação do novo sistema não dará novos poderes ao Executivo e que,
para começar a valer, após ser declarada pelo presidente da República,
a mobilização nacional precisa ser aprovada pelo Congresso. "A
Constituição brasileira proíbe a guerra de conquistas, então ninguém
quer conquistar nada, a gente quer sim preservar o que já se tem".
"Ela [a lei] inicia a estruturação de algo essencial, que é a
possibilidade de o Estado brasileiro preparar-se e ter condições de
reagir adequadamente, em caso de agressão", diz Paulo Kuhlmann. Para
ele, a nova legislação é positiva, pois cria um órgão que possibilita
"pensar e estruturar algo nacional a respeito da mobilização". "A
partir daí serão elaboradas a Política de Mobilização Nacional e as
Diretrizes de Mobilização Nacional", complementa.
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