terça-feira, 26 de agosto de 2008

Executivo quer criar 85 mil cargos em 2008

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Erich Decat

Sem alarde, o governo federal pretende aumentar em seis vezes o número de cargos a serem criados até o fim do ano em relação à proposta orçamentária encaminhada ao Legislativo. Projeto de lei enviado semana passada ao Congresso eleva de 13.375 para 85.925 o número de vagas previstas para serem abertas no Executivo até 31 de dezembro. A grande maioria via concurso público.

Caso a nova estimativa seja posta em prática, o número de cargos criados em apenas 12 meses vai superar em 35% o total registrado desde o início do primeiro mandato do presidente Lula até o final do ano passado. Nesses cinco anos, foram abertas 69,6 mil vagas.

As áreas de seguridade social, educação e esporte serão as principais contempladas com a criação de cargos, empregos e funções. Em vez dos 10.375 postos inicialmente previstos para esses setores este ano, o governo admite agora expandir o número para 60.578.
 
A proposta do Planalto (PLN 31/08) altera o anexo V da Lei Orçamentária Anual (LOA). Com a mudança na tabela de despesa pessoal e encargos sociais, o Executivo pretende adequar a LOA às recentes propostas aprovadas no Congresso, uma vez que elas já extrapolaram a quantidade de cargos prevista inicialmente. Do início do ano pra cá, os parlamentares já aprovaram a criação de 22.833 novos cargos.

Como a maioria das vagas só deve ser criada no final do ano, o impacto desses gastos não deve ultrapassar os R$ 200 milhões. Com isso, a previsão do governo em gastar com os servidores que irão preencher esses cargos deve passar de R$ 948 milhões para R$ 1,1 bilhão.

A matéria está para ser votada no início de setembro na Comissão Mista de Orçamento (CMO). Se for aprovada, seguirá para apreciação conjunta de deputados e senadores no plenário do Congresso.

Na última quarta-feira (20), a CMO designou o deputado Vilson Covatti (PP-RS) como relator do projeto. O prazo para recebimento de emendas vence amanhã (27).
 
Procurado pela reportagem, Covatti disse que ainda desconhece o conteúdo da matéria. O presidente da CMO, deputado Mendes Ribeiro Filho (PMDB-RS), apesar de prever que a proposta será votada na comissão no dia 3 de setembro, também não opinou sobre as mudanças, alegando que qualquer afirmação poderia ser considerada como uma interferência no trabalho do relator.

Parlamentares da oposição questionam a necessidade de criação dos novos cargos e cobram mais planejamento por parte do Executivo. Mas a proposta é desconhecida até mesmo dos governistas.

Questão de necessidade

Já os principais órgãos beneficiados com as mudanças alegam que as contratações são necessárias para substituir profissionais que se aposentaram nos últimos anos e para atender à demanda em várias regiões do país ainda carentes de servidores federais.

Por sua vez, o Ministério do Planejamento alega que é “normal” superestimar a quantidade de cargos previstos na tabela da LOA e que essas vagas não serão “necessariamente criadas”. Quanto ao impacto no orçamento deste ano, o ministério afirma que ainda não está estabelecida a origem dos possíveis gastos. Argumenta que isso será feito apenas quando os projetos de lei ou medidas provisórias que tratarem dos respectivos quadros forem encaminhados ao Congresso.

Com a revisão proposta, o número de postos a serem criados este ano nos três poderes, em nível federal, deve passar de 32.969 para 105.519. Além de multiplicar por seis a previsão de cargos no Executivo, o projeto de lei que será analisado pela CMO mantém as 19.415 vagas previstas para o Judiciário e eleva de 179 para 180 as destinadas ao Legislativo.

Para o cientista político Leonardo Barreto, a ampliação do número de cargos faz parte do cumprimento de um compromisso que o presidente Lula e o PT assumiram desde o primeiro mandato.

"Acredito que o presidente Lula quer aumentar o número de cargos agora para se antecipar ao próximo ano, período que deve ser mais difícil a aprovação de propostas desse tipo, uma vez que todos estarão de olho nas eleições de 2010", avaliou o cientista político da Universidade de Brasília (UnB). "A criação desses cargos também é uma questão programática do presidente Lula e do PT, no sentido de reconstruir o Estado", acrescentou.

Oposição cobra planejamento

Para o vice-líder do DEM na Câmara, José Carlos Aleluia (BA), a reestimativa enviada pelo Executivo revela um descontrole por parte do governo federal com as contas públicas.
 
"O governo perdeu completamente o controle dos gastos públicos. Quando o governo aumenta a despesa, ele tem que buscar o pagamento dessa despesa em algum lugar. A forma de compensar esse aumento é normalmente aumentando o preço das coisas, aumentando o imposto, então há um desequilíbrio das contas públicas que gera inflação", disparou o parlamentar.
 
Apesar de não questionar a necessidade da ampliação dos quadros, desde que as vagas acompanhem a evolução do crescimento econômico do país, o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR) critica o planejamento adotado pelo governo Lula.
 
"Ainda não dei uma olhada nessa tabela, mas, isso vai na contramão do planejamento, não é uma mudança qualquer", avaliou.
 
Segundo o parlamentar, o crescimento dos gastos públicos ocorre em descompasso com o do Produto Interno Bruto (PIB).
 
"Isso é uma bomba-relógio, o presidente Lula está transferindo o problema para o próximo governo. E, se verificarmos no meio dessas propostas, normalmente, colocam-se cargos comissionados e quando votamos contra, vem aquele discurso previsível: ‘eles não querem que a educação avance’", concluiu.

Procurado pela reportagem, o líder do PT na Câmara, Maurício Rands (PE), disse que ainda desconhece a proposta do Executivo e que, por isso, preferia não comentar o assunto.

Educação
 
Em maio, os parlamentares aprovaram proposta do Executivo que culminou na criação de 18.424 cargos de professores nos níveis fundamental, médio e técnico-administrativo em educação. Segundo o Ministério da Educação (MEC), o impacto orçamentário das contratações em 2008 é estimado em R$ 100 milhões.
 
De acordo com o diretor de Desenvolvimento da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica do MEC, Getúlio Marques Ferreira, os novos professores irão substituir os servidores que se aposentaram nos últimos anos.
 
"Além da substituição, esses professores serão encaminhados para as novas escolas técnicas. Tivemos uma expansão neste último ano chegando a 54 escolas técnicas espalhadas em todos os estados", afirmou Ferreira. Segundo ele, está prevista a construção de mais 150 escolas, das quais 104 estão em processo de licitação. "A quantidade de novos funcionários compreende o que solicitamos", ressaltou.
 
MP da discórdia
 
Além dos 22.833 cargos já criados este ano, após aprovação do Congresso, outras duas proposições abrem novas vagas no Executivo. A primeira (PL 1746/2007) cria 8.400 novos cargos para o MEC. Desse total, 5 mil para pessoal técnico-administrativos, 2.800 para professor da carreira do magistério superior; 180 para cargos de comissão e 420 para funções gratificadas.

Sem acordo entre governistas e a oposição, a proposta deve ser votada apenas após as eleições municipais de outubro.
 
Já a medida provisória que cria o Ministério da Pesca prevê outros 300 novos postos. A medida, no entanto, encontra resistência no Congresso. Por causa disso, o ministro das Relações Institucionais, José Múcio, admitiu ontem que o presidente Lula deve abandonar a MP e tratar do assunto por projeto de lei, como querem os oposicionistas.

“Não vamos travar uma queda de braço. A esta altura, o melhor é retirar [a matéria da pauta do Congresso]”, declarou Múcio, após participar de reunião da coordenação política (leia mais).

"A MP da Pesca é uma coisa infeliz, é um barco furado, a própria base está revoltada", criticou José Carlos Aleluia, vice-líder do DEM.

Como o governo tem recorrido a medidas provisórias para criar quadros no Executivo, a elevação do número de vagas a serem abertas este ano deve esticar o cabo de guerra entre o Planalto e, sobretudo, a oposição no Congresso. Para evitar maiores tensionamentos, como a obstrução da pauta e a rebelião da própria base governista, o governo deve criar cargos também por projetos de lei, cuja tramitação é mais lenta.

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