terça-feira, 4 de março de 2008

Fw: O consumidor e a luta “quixotesca” contra as corporações

URL: http://congressoemfoco.ig.com.br/Noticia.aspx?id=21219
Paulo Pimenta*

Mais uma vez, volto a tratar da qualidade dos serviços prestados aos
consumidores em nosso país. Recentemente, proferi no grande expediente
da Câmara dos Deputados um discurso que levou a uma grande repercussão
entre a população. As inúmeras manifestações de apoio me trazem a
convicção de que, atualmente, esse é um dos maiores problemas
enfrentados pelos brasileiros em suas relações com as empresas das
quais contratam serviços. Desde 1990, os brasileiros possuem um valioso
instrumento de proteção: o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Quando
entrou em vigor, o CDC foi apontado como um dos mais avançados do
mundo. Com ele, nosso país deu um salto gigantesco na defesa do que
sempre chamei de "lado fraco" da relação consumidor-empresa: o cidadão.
Com a vigência do novo Código, o fortalecimento e a multiplicação dos
Procons, essa conquista se tornou visível. É incrível o esforço que
esses abnegados servidores fazem cumprindo seu trabalho, tornando os
Procons órgãos de verdadeira excelência. Mesmo tendo de atender a uma
gigantesca demanda e possuindo limitados recursos estruturais e
humanos, os serviços por eles prestados são eficientes e quase sempre
irretocáveis. Uma profunda mudança de mentalidade foi iniciada desde
1990, mas muito ainda precisa acontecer para que atinjamos a plenitude
desse avanço. Muitas vezes o Código é desrespeitado, ocorrendo também
implementações parciais de alguns pontos: o que interessa é aplicado; o
que não, esquecido. Apesar de ser uma lei excelente, o Código sempre
careceu de uma defesa mais incisiva em determinadas áreas. Faça-se
justiça, os governos nem sempre deram o apoio institucional e político
de que os órgãos de proteção precisavam para enfrentar seus adversários
nessa luta quixotesca: as grandes corporações. Sei como são negativos
os efeitos do mau atendimento por parte das empresas, e acredito ser
fundamental que lutemos por maior qualidade na prestação deste serviço.
Por isso, sempre dediquei parte de minha atuação parlamentar a este
tema. Apesar de serem muitas as iniciativas parlamentares, elas
invariavelmente encontram muitas dificuldades para tramitar no
Congresso Nacional. Demoram anos a percorrer as comissões temáticas e,
quando chegam à votação em Plenário, correm o risco de simplesmente não
serem aprovadas. Isso ocorre, já disse em outras oportunidades, porque
vão de encontro a interesses poderosos de grandes empresas. Mesmo
sabendo dessas dificuldades e enfrentando resistências dentro e fora do
Congresso, estou convencido de que somente a persistência nessa luta
poderá nos levar a um equilíbrio na relação consumidor-empresa. Com o
passar dos anos, alguns avanços pontuais se fizeram sentir, e há poucos
dias foram anunciadas medidas que atacam os problemas em dois setores
que são campeões de reclamações: a telefonia móvel e as televisões a
cabo. Na área da telefonia móvel, entraram em vigor medidas que irão
beneficiar amplamente os seus mais de 120 milhões de consumidores. As
operadoras terão de atender às solicitações de cancelamento de linha em
até 24 horas, independentemente da existência de débitos. Todas as
reclamações ou questionamentos deverão ser solucionados ou respondidos
em até cinco dias. Em caso de cobrança indevida, os valores terão de
ser ressarcidos em dobro e com correção monetária. A validade dos
créditos pré-pagos será de 180 dias, sendo que será revalidado o uso
dos mais antigos quando de novas recargas. Mesmo quando não houver
crédito, os aparelhos poderão continuar ligando para números 0800 e de
emergência (parece incrível, mas, para as operadoras, o cliente que não
possuísse créditos no celular não tinha o direito de chamar socorro em
caso de necessidade!). E aquele que aparenta ser o maior dos problemas
também tem tudo para acabar: as empresas terão de manter atendimento
presencial aos clientes, acabando com a situação surreal de nos
indignarmos com gravações de vozes mecânicas que nem entendem o que
dizemos, que dirá solucionar nossos problemas. Agora, poderemos nos
dirigir à empresa e exigir, pessoalmente, o atendimento de nossa
solicitação, acabando com o subterfúgio usado pelas empresas de se
esconderem atrás de intermináveis – e pagas – ligações telefônicas para
centrais de atendimento ineficientes. Dentro de algum tempo, entrará em
vigor também a possibilidade de o consumidor, ao trocar de operadora,
manter o mesmo número de telefone, trazendo mais conforto para quem não
estiver satisfeito com os serviços de determinada empresa e sem que se
preocupe com eventuais dificuldades ou prejuízos decorrentes da mudança
de número. Um efeito certo dessas medidas será o aumento da qualidade
dos serviços. Devemos torcer para que também ocorra a diminuição dos
preços cobrados pelas operadoras, já que agora terão de disputar mais
acirradamente os clientes, mais atentos às vantagens oferecidas por
cada empresa. No caso das televisões a cabo, a mudança também é
profunda. Em dezembro passado, a Anatel editou o Regulamento de
Proteção e Defesa dos Direitos dos Assinantes dos Serviços de Televisão
por Assinatura, que disciplina estes serviços em todo o país. As
principais mudanças trazidas pelo novo Regulamento são: devolução em
dobro e em dinheiro de cobranças indevidas; abatimento do valor
proporcional ao período em caso de interrupção de sinal; possibilidade
de os usuários pedirem a suspensão dos serviços, sem custo, de 30 a 120
dias por ano (em casos de viagem, por exemplo); prazo de cinco dias
para as empresas resolverem reclamações ou responderem questionamentos
dos usuários; atendimento telefônico diário e gratuito a reclamações no
horário das 9h às 21h; obrigatoriedade de aceitação prévia por parte do
usuário a todo novo valor incluído em sua fatura; informação com 30
dias de antecedência mínima no caso de alterações promovidas pelas
operadoras no plano de serviços contratados, resguardada a
possibilidade do usuário rescindir o contrato, sem ônus; e previsão
contratual do preço do serviço, do índice de reajuste e de sua
periodicidade. Muitas vezes nos deparamos com a singeleza de algumas
mudanças; parecem tão óbvias que nem precisariam de lei para prevê-las.
Ocorre que precisam, sim, de previsão legal, todas as medidas que regem
a relação do consumidor com a empresa contratada. Do contrário, elas
sempre acharão uma brecha para aumentar seus lucros em detrimento da
qualidade dos serviços ou da satisfação dos usuários. Isso decorre, no
caso das operadoras de televisão a cabo, da falta de efetiva
concorrência no setor. Existem pouquíssimas empresas no ramo, e os
preços cobrados segmentam os usuários em faixas sócio-econômicas
elitizadas e que não disputam dentre si. Torcemos para que chegue logo
o dia em que os brasileiros possam contar com uma oferta de empresas,
planos e serviços realmente variados, sendo possível escolher dentre
estes o de seu maior interesse. Por fim, vale lembrar que essas
medidas, por si só, não farão as mudanças acontecerem. Para que
possamos consolidar estas grandes vitórias, cabe a cada um de nós
fiscalizar, exigir seu cumprimento, fazer uso dos serviços para aferir
sua eficiência. Assim, com o tempo, a postura crítica de cidadãos
conscientes de seus direitos surtirá o efeito desejado, tornando
possível um novo salto de qualidade na relação entre consumidores e
prestadores de serviços, fazendo justiça a quem paga por eles. Paulo
Pimenta (PT-RS), 42 anos, é jornalista e deputado federal. Em 2006, foi
relator da CPI do Tráfico de Armas.

--

Nenhum comentário: