Edson Sardinha, Lúcio Lambranho e Eduardo Militão
Parlamentares negam existir qualquer tipo de conflito de interesse
porque fizeram emendas para beneficiar usineiros na MP 413 e, ao mesmo
tempo, tiveram suas campanhas financiadas por essas empresas. Segundo
eles, muitas vezes o que existe é "coerência", porque estão cuidando
dos interesses de seus eleitores, de seus negócios e da população em
geral, que poderá comprar combustível mais barato com as medidas
sugeridas nas emendas.
O deputado Paulo Maluf (PP-SP), que recebeu o maior volume de doações
do setor sucroalcooleiro, não admite qualquer suspeita de barganha. Ele
declarou ao Congresso em Foco que sua emenda foi motivada
exclusivamente pelo "mais alto interesse público", porque pretende
permitir que as usinas vendam álcool diretamente para qualquer posto de
combustível, sem interferência das distribuidoras.
"Se você quer fofoca, eu estou com 76 anos de idade e estou um pouco
escolado contra maldade de foca [jornalista iniciante]", afirmou Maluf,
irritado. "Se você quiser fofoca, para ter lead [notícia] de um jornal,
você não vai ter comigo", emendou.
Ele recebeu R$ 300 mil do setor alcooleiro e fez uma emenda à MP 413.
De acordo com Maluf, atualmente, acontece o "absurdo" de uma usina
produzir álcool no noroeste de São Paulo, mandá-lo para uma
distribuidora a 400 quilômetros de distância e o produto ser enviado de
volta, em nova viagem de 400 quilômetros, aos postos do noroeste
paulista. "Do jeito que estava, era alcoolturismo", ironizou. Com a
emenda, o deputado sustenta que o preço do combustível vai cair para o
consumidor.
Identidade de interesses
O deputado Antônio Carlos Mendes Thame (PSDB-SP) disse que as emendas
visam a beneficiar seus eleitores. Presidente da Frente Parlamentar dos
Biocombustíveis, ele disse que as associações de produtores de cana,
que vendem para os usineiros, têm um vínculo forte com ele.
"Esses são meus eleitores. São 25 mil famílias. Sou um defensor dos
produtores de cana", diz Thame. Ele não vê conflitos de interesses na
relação entre as doações das usinas e as emendas. "Ao contrário, há uma
identidade de interesses." O tucano, que recebeu R$ 170 mil do setor,
fez cinco emendas à medida provisória.
Thame afirma que ele mesmo procurou os produtores de cana quando soube
da MP 413. O deputado conta que fez as emendas e as enviou para
diversas pessoas por correio eletrônico. Existem emendas dele idênticas
a textos assinados por outros parlamentares, até por José Eduardo
Cardozo (PT-SP) – integrante de uma legenda ferrenha adversária do PSDB
em São Paulo.
Thame admite a possibilidade de alguns textos dele terem sido copiados
e que ele mesmo tenha assinado proposições preparadas pelo setor
sucroalcooleiro.
Investigação
Produtor de cana de uma cooperativa de Rolândia (PR) dona de uma usina
de álcool, o deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR) também alega que não
há conflito de interesse no fato de ter apresentado emenda para um
segmento que o beneficiou em 2006. O problema, afirma ele, seria o
lobby das distribuidoras dentro do governo ao patrocinar a MP 413, que
muda a tributação do setor. O deputado quer uma investigação sobre o
assunto a ponto de "botar na cadeia" os reais autores da MP.
"Os lobistas que infiltraram dentro do governo, do sindicato dos
combustíveis, é que têm que explicar a origem dessa coisa. Queremos
saber como foi feito esse lobby dentro do governo Lula, quem defende
esse Sindicom [sindicato das distribuidoras] aqui no Congresso e no
governo."
Hauly,que recebeu R$ 55 mil do setor sucroalcooleiro, fez 12 emendas
para favorecer o segmento. Ele disse a medida provisória foi assunto de
uma reunião da cooperativa de Rolândia, da qual participa. Os
parlamentares foram cobrados no encontro. "Como vocês, deputados do
Paraná, São Paulo, Minas e Mato Grosso, aceitam um esbulho desses?",
relata o parlamentar paranaense a cobrança feita pelos cooperados.
Para o deputado, o motivo de muitas emendas serem iguais é que a MP 413
mexeu com o setor de álcool de todo o país, o que teria mobilizado
produtores de diversos estados.
Financiamento público
O deputado José Eduardo Cardozo é autor de uma emenda à medida
provisória, mas não recebeu recursos do setor alcooleiro. Ele acredita
que os textos inseridos pelos deputados e senadores devem ser
analisados em seu conteúdo, e não apenas pela relação do parlamentar
com seus financiadores de campanha. Por conta das dúvidas suscitadas
desse relacionamento, Cardozo defende o financiamento público das
campanhas.
"O problema é o sistema eleitoral. É terrível para o parlamentar que
recebeu financiamento e entende que a coisa [emenda] é correta para o
país. Sempre ficará a suspeita de que ele está fazendo isso como
pagamento de alguma coisa", avalia.
Cardozo disse que foi procurado pelo advogado da União da Indústria de
Cana e Açúcar (Única) para debater a autorização para a exploração do
mercado de dutos de álcool. Ele disse, como professor de direito
administrativo, estudou a matéria e assinou sua emenda conforme pediram
os empresários. "A sugestão me pareceu razoável", diz o petista. Mas
ele afirmou desconhecer que sua emenda fosse idêntica à de Mendes Thame.
Na quarta-feira passada (12), a reportagem enviou correio eletrônico
para os 21 parlamentares que fizeram emendas à MP 413 para beneficiar o
setor de álcool. Na ocasião, se ofereceu para falar pessoalmente ou por
telefone com os deputados e senadores ou receber as informações por
escrito. Mas, afora os parlamentares localizados pelo site, nenhum
deles respondeu às perguntas do Congresso em Foco até a última
segunda-feira (17).
LEIA TAMBÉM
Lobby do álcool ataca MP dos Bancos
Usineiros dizem que procuram parlamentares conhecidos
Consultor critica método de combate à sonegação
Deputados apresentam emendas iguais
--
Nenhum comentário:
Postar um comentário