segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Novas do Estado-Babá petista

URL: http://www.implicante.org/artigos/novas-do-estado-baba-petista/


por Flavio Morgenstern

“Algum de vocês pode dizer sinceramente que a Carta dos Direitos passaria pelo Congresso atualmente? Ela sequer seria votada.” – F. Lee Batley

O governo está discutindo (de novo) se permite a comercialização de cigarros mentolados no Brasil. Um segredo para fumantes e não-fumantes: já fumaram um cigarro de tabaco puro e natural, desses que caipira enrola na palha? É uma merda. Ninguém que já experimentou algo mais saboroso do que larva de cupim cozida consegue gostar daquilo. Todo o sabor do cigarro é devido, oras, ás 300 mil substâncias cancerígenas que colocam ali (ou acham que a indústria do tabaco mata sua clientela por puro prazer?).

Vai lá o governo e… proibe a menta.

Não é um caso isolado. Enquanto tentamos nos tornar o primeiro país menta-free (epa! Free não!) e vamos vivendo nossa vidinha, uma turma da pesada está trabalhando arduamente para controlar nossas vidas: decidir o que comemos, quais valores devemos ter, o que assistimos na TV, em que horário, o que lemos, o que ouvimos, o que fumamos, o que vestimos. Quer dizer, até agora não votaram nada na Câmara – segundo diagnóstico de Romário (PSB-RJ), aquele que sempre fugia dos treinos, se diz 'puto' e pede 'alguma porra pra fazer' em Brasília. Agora tem Carnaval, então não há nenhum burocrata estatal cuidando de pensar em leis para nos proteger. Quer dizer, mais ou menos. O Estado Big Brother é tão repetitivo que há sites oferecendo projetos de lei prontos para vereadores comprarem. Quem precisa de um vereador, se podemos apenas decidir tudo na porrinha?

Na União Soviétia, o Big Brother assiste você

Esse é um lado da social-democracia (ou “Estado de Bem-Estar Social”, quando precisam de um nome pomposo em extenso para dar a entender que é um conceito etéreo e inalcançável, e não atentar para o fato de que já vivemos em uma social-democracia há tempos e é isso aí mesmo) que os românticos com a idéia insistem em nunca enxergar. Mais Estado controlando “desigualdade” e outros que tais significa, é claro, mais leis controlando a população para ela não fugir da linha. E se diferenciar muito do seu vizinho já é um risco bem alto. Quem decide? O poder maravilhoso do Estado. Mas como ‘Estado’ é uma abstração coletiva, o fato é que quem decide o que ler, ver, assistir, comer e fumar são burocratas. Vereadores, deputados e outra turma que entende tanto sobre a vida quanto um padre entende sobre sexo (sob corruptela de Paulo Francis).

Em livro recentemente lançado no Brasil, o hilário e obrigatório O Estado Babá: Como radicais, bons samaritanos, moralistas e outros burocratas cabeças-duras tentam infantilizar a sociedade, o colunista David Harsanyi mostra como uma população cada dia mais informada e com um padrão de vida cada geração melhor que a passada (pense na sua infância, na do seu pai, do seu avô e, depois, na do seu filho) está sendo tratada como retardada pela turma que depois dá entrevistas começando as respostas por “No meu governo…”.

“(…) Embora tragicamente mal utilizado, o bom senso é uma habilidade cerebral tão valiosa quanto qualquer outra. É também um dos melhores recursos – embora não seja o único – para farejar uma lei-babá: você identifica quando vê. O autor de sátira política P. J. O’Rourke uma vez descreveu os princípios básicos da administração em uma sociedade livre como: ‘Pense em sua própria empresa. Contenha-se’.”

Será um fator apenas americano? Vejamos algumas notícias só dessa semana que vimos partindo dos petistas e seus aliados por aqui.

OAB recebe projeto que impede a transmissão pela TV de luta como MMA

O deputado federal José Mentor (PT-SP) enviou ao presidente nacional da OAB, Ophir Cavalcante, o projeto de lei 5534/09, que veda a transmissão pelas TVs brasileiras de lutas consideradas violentas, tais como o MMA (Mixed Martial Arts):

Segundo o parlamentar, a intenção do projeto é impedir a transmissão de lutas não olímpicas por canais abertos e fechados e, caso venham a ser veiculadas, que, necessariamente, haja a autorização prévia do Conselho Nacional de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana.

“No Brasil é proibida a rinha de galo. Então porque estamos permitindo a rinha humana, na forma de 'gladiadores do século XXI’”, questionou o parlamentar, ressaltando que o projeto tem por finalidade resguardar que crianças e jovens assistam a cenas de violência explícitas e voluntárias.

Se entendi bem, o bom parlamentar está comparando uma rinha de galo, crime ambiental por abusar de seres juridicamente, ehrr, “incapazes”, com lutadores de MMA. A meu ver, só isso já seria ensejo para que todo lutador do UFC, do Pride e até da escola de karatê ali da esquina tascasse um processo bravo no lombo do nosso deputado. Alguém chama o Anderson Silva aí, quero ver o José Mentor chamá-lo de incapaz na cara dele!

Claro, tais “lutas violentas” são vistas em qualquer academia. Há interessantes projetos para tirar crianças da miséria através das artes marciais, exercício de disciplina para o cérebro e o corpo, como exposto pelo ator  franco-argelino Dida Diafat na Câmara dos Vereadores de Porto Alegre. Diafat contou como saiu da pobreza graças ao esporte, tornando-se 11 vezes campeão mundial de muay thai e contracenando com o astro Jean-Claude Van Damme. mas teve de pedir atenção dos vereadores que conversavam enquanto discursava:

– Sou próximo do governo francês e, quando falo com ministros, por exemplo, eles estão focados. Fiquei irritado ontem (15/06/2009) porque tive a sensação de que os políticos não se importam muito com as crianças brasileiras – disse Diafat, rumo o aeroporto Salgado Filho, onde embarcaria para a França.

Todavia, também vê-se que o nobre parlamentar está preocupado com as nossas criancinhas. Claramente, a criançada vê muita violência na TV. Em menos de 5 minutos, é capaz de ver alguém ser esfolado, levar um tiro, ser arrastado pelo chão, ter a cabeça atingida por tacos de beisebol e ainda ser jogada a cães bravos e famintos. Não, não é no programa do Datena: qualquer episódio de Pernalonga tem dessas cenas. Parece que estamos formando psicopatas em massa desde o surgimento dos Looney Tunes… porém, se a preocupação de Sua Excelência são as criancinhas, vejamos o que Dida Diafat tem a dizer após ser interrompido quando explicava como tirar crianças da miséria através do esporte:

– Nos Estados Unidos, Alemanha e Espanha, quando falamos de crianças, todo mundo escuta porque ama as crianças.

Claro, havia motivos para a interrupção e o desdém com o pequeno discurso de quatro minutos sobre criancinhas, como explicou o decano da Casa, João Dib (PP):

– Ele não estava trajado convenientemente. Eu não merecia ter a atenção chamada por um diabo que veio sei lá de onde. Ele pode ser artista de cinema, mas eu sou vereador de Porto Alegre – disse o ex-prefeito, relembrando o episódio. (…)"

Entenderam como as artes marciais são um perigo para as criancinhas do nosso Brasil? Citando o excelente Rodrigo Álvares do extinto (requiescat in pace) Nova Corja:

Falando nisso, já tiraram as crianças das esquinas da avenida Ipiranga? Ou das pontes que cruzam o Dilúvio? Era uma tarefa do PT e que José Fogaça (PPS/ PMDB) não consegue resolver há cinco anos [o texto é de 2009]. Alguém protesta? Claro que não. Dá trabalho ir até a prefeitura. É sujo e tem ciganas lá, cruzes.

Todavia, em sendo o glorioso parlamentar um petista, que tal também evitar que a meninada veja coisas como essas na TV?

http://www.youtube.com/watch?v=awDXayS3HTg

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São casos claros de violência, brutalidade e atentado à moral, aos bons costumes e, pelo menos no caso da Ângela Guadagnin, à estética a que crianças estão expostas ao assistirem TV. Há duas formas de combater isso: uma delas é exigindo que um partido e seus aliados não cometam tais atos. Outra, um pouco menos trabalhosa, é proibir câmeras de TV de dedurarem tudo. Um dedicado deputado petista claramente sabe o que é o melhor para o país – e nossas criancinhas.

Alguém poderia ventilar a hipótese de que o governo exigindo autorização prévia antes de permitir a veiculação de algo que está com sucesso em ascensão é apenas um meio de filar uma boquinha do bolo, exigindo que burocratas, bons samaritanos e outras pessoas que se esfainam dia e noite pelo nosso bem-estar decidam o que pode ou não ser veiculado, e talvez até se tornem um pouco mais dóceis na triagem se ganharem um pirulito. Porém, não sejamos pessimistas. Será que, nos tornando burocratas, também conseguimos assistir ao Pride pra ver se os nocautes foram dolorosos demais para serem transmitidos ou não?

Jovens de baixa renda terão passagens de avião gratuitas, prevê projeto

Falando em avião, Marta Suplicy e Marco Aurélio “Top-Top” Garcia, um projeto de iniciativa do governo Lula que ficou sete anos tramitando na Câmara foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ), seja lá o que uma Comissão dessas agrupe ou signifique.

O projeto institui o Estatuto da Juventude e prevê que jovens de 15 a 29 de baixa renda terão duas passagens gratuitas em todos os aviões, ônibus e barcos interestaduais que transitarem no País, além de duas passagens com desconto de 50%, se o benefício integral já tiver sido utilizado. Os jovens de 15 a 29 anos terão, ainda meia-entrada nos eventos culturais e esportivos financiados com dinheiro público e 40% de desconto nos eventos patrocinados pela iniciativa privada. Claro, já se inclui ingressos para eventos culturais como Copa do Mundo e Olimpíadas, e crê-se que os ingressos para a primeira apresentação integral de As Valquírias, de Richard Wagner, em solo nacional, estarão esgotadíssimos e só jovens filiados a UNE testemunharão o glorioso momento.

Claro que o dinheiro deve sair de algum lugar. Talvez sejam de pessoas menos favorecidas do que a marmanjada universitária que pede desconto em ingresso de futebol e passagem de avião, mas também, nunca ninguém ligou pra elas, não será um Estatuto do “Jovem” (até 29 anos) que vai passar a se importar com eles, ou pra quem eles pagam passagem de avião, ”independentemente do motivo da viagem”.

E para não dizer que não falaram das flores, o Estatuto também tem propostas para quem tem uma enxada na mão e muito mato pra carpir à sua frente:

Os privilégios previstos para essa faixa etária se estende igualmente à criação de linhas de crédito específica, destinada à agricultura orgânica e agroecológica e à “efetiva inclusão dos jovens nos espaços públicos de decisão com direito a voz e voto”.

Difícil vai ser essa belezura ter alguma aplicação para jovens cujo maior contato com algo que se assemelha a mato afrontar o Código Penal.

Projeto de Lei para proibir jogos ofensivos ganha 2º voto favorável no Senado

Nesta última quarta-feira (15) ganhou mais um voto para aprovação o Projeto de Lei (170/06), de autoria do senador Valdir Raupp (PMDB-RO), que torna crime fabricar, importar ou distribuir jogos de videogames ofensivos “aos costumes e às tradições dos povos, aos seus cultos, credos, religiões e símbolos”.

O primeiro voto favorável foi dado em relatório de dezembro de 2010, pela senadora Serys Slhessarenko (PT-MT). O segundo voto é do senador Vital do Rêgo (também PMDB-PB). O PT e PMDB ofendem profundamente os meus costumes, as minhas tradições, o meu povo, o meu culto, o meu credo, a minha religião e até os meus símbolos, embora ninguém aparentemente tenha se preocupado com isso. O senador emitiu relatório favorável na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, e agora o projeto segue triunfante seu caminho como matéria pronta para aprovação na mesma Comissão.

A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania aparenta estar muito ocupada com videogames ofensivos e dinheiro pra turminha da UNE ver a Copa. Por este projeto, a simples importação de “jogos ofensivos” e a divulgação de conteúdo discriminatório por meio dos videogames seriam equiparados ao crime de preconceito previsto no artigo 20 da lei. A pena pela infração é de um a três anos de reclusão.

Algumas coisas ficaram muito vagas nessa patacoada toda. Um jogo como Wolfenstein 3D faz o jogador se sentir na pele (quer dizer, nem tanto) de um prisioneiro da Segunda Guerra que sai matando nazistas para conseguir fugir. Matar nazistas ofende muita gente, inclusive alguns que se consideram um “povo” específico, em separado dos demais, com “tradições” próprias, “cultuando” uma personalidade que o jogo deprecia,além de destruir seus “símbolos”. Será proibido?

Também tem um tal de Resident Evil 5, que tem zumbis na África. Matar zumbis (que já estão mortos) não parece passível ser de grandes ofensas, mas devemos levar em conta que tribos da África, quando foram levadas ao Haiti, criaram uma religião que cultua vodu e parece ter envolvimento claro com magia negra que levanta zumbis do túmulo. Além do preconceito com tribos (ainda que o projeto não inclua “tribos” como “povos”), ainda pode ser facilmente um jogo considerado “racista”, que além de tudo, é inafiançável e imprescritível. E agora, como folgar com zumbis?!

O que ofende uns não ofende outros. Um jogo de tiro ao pato pode ofender o povo do Greenpeace. Um jogo de tiro ao tucano talvez não ofenda tanto os petistas. Tem jogo tirando sarro de redneck americano que vota no Tea Party (quem não se lembra de Redneck Rampage não teve adolescência). Jà Call of Duty 2: Modern Warfare simula um ataque terrorista em sua missão opcional No Russian no aeroporto de Moscou matando civis. A sensação só de ver o vídeo já não é lá muito boa, e não se deve esquecer que os grupos que fazem isso na vida real lá fora de nossa poltrona (e do Congresso) são grupos que justamente reclamam das ofensas ao seu “costumes”, “tradições”, “povo”, “culto”, “credo”, “religião” e “símbolos”. Um detalhe que deve ofender profundamente aos nobres deputados: o jogo é usado pelo Exército americano como aprendizado aos futuros soldados.

E quando a coisa aparece como crítica, como a ironia de jogos que tratam de pedofilia ou tráfico de drogas, como uma cena em Max Payne em que o protagonista tem drogas injetadas em seu organismo, e controlar o personagem drogado se torna um amargo pesadelo para o jogador? Como fica? E aquele negócio de incentivar a indústria nacional, que pela primeira vez em décadas está podendo produzir algo em matéria de videogames, uma indústria que já lucra mais do que Hollywood, mas que tinha nos BRICs uma ausência quase completa da letra B até pouco tempo?

Valdir Raupp afirmou não ter o hábito de jogar videogame, além de não saber mencionar nenhum game específico que poderia se enquadrar no projeto de lei.

PT censura música no carnaval de Recife

Ok, palavra de quem tem alergia a Carnaval e nojinho de samba-enredo, mas o PT censurou um samba-enredo do Carnaval do Recife. Sério, ouçam ISSO.

Conclusão: quanto custa cada lei ou é por quilo?

Devemos concluir com um breve questionamento. Toda vez que se defende a atuação estatal, fala-se do Estado como o grande mediador, o árbitro que evita que nossas ações nos levem pro buraco. É assim desde antes de Hobbes, mas atualmente o Grande Estado Irmão é praticamente um apanágio da esquerda. O Estado é colocado em oposição ao “mercado”, e esquecem-se de que ambos são abstrações, e o que existe são pessoas: o mercado somos nós, e o Estado são uns burocratas de terno e gravata que ganham bem mais do que… nós.

É muito comum o discurso de que o mercado (é com nós mesmos que estão falando) gera desigualdade, e que portanto deve haver uma força estatal que promova a igualdade. Portanto, mercado (uma pessoa que economiza para criar uma banca de jornal ou padaria, por exemplo) é extremamente desigual. Uma verdadeira anarquia, um descontrole que pode ser visto na análise de uma Bolsa de Valores. O Estado serve para controlar as pessoas e promover uma sociedade mais igualitária. Há uma boa notícia, portanto. Vejamos agora uma boa nova que circulou na internet (o maior mecanismo de circulação de abobrinhas já inventado):

Ora, alguns podem achar que isso significa que o Estado brasileiro não gosta de Educação. Bobagem. Foram os educadores os que mais propalaram a idéia anti-mercado acima exposta. Agora, finalmente o Estado está cuidando das nossas crianças, do MMA, do videogame, impedindo que ouçam música carnavalesca sem valores e ainda dando passagem de avião de graça. É o puro reino da igualdade. Para isso, educadores defendem tanto o Estado: nunca aceitariam, por exemplo, diminuir o seu tamanho ou promover uma iniciativa privada desigual. Finalmente, estão sendo ouvidos pelos burocratas que defendem: resta saber como promover isso agora sem que os burocratas que controlam os videogames ganhem mais do que os professores.

Flavio Morgenstern é redator, tradutor e analista de mídia. Quer um videogame em que você saia por aí atirando em emendas parlamentares. No Twitter, @flaviomorgen

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