segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Pior a emenda que o soneto - opiniao - versaoimpressa - Estadão

Num desses casos típicos em que a emenda sai pior do que o soneto, o
deputado Cândido Vaccarezza, líder do governo, meteu os pés pelas mãos
ao tentar minimizar a importância da revelação feita pela Folha de
S.Paulo, de que o ministro Carlos Lupi, de 2000 a 2006, na condição de
assessor técnico do gabinete da liderança do PDT na Câmara dos
Deputados, não dava expediente regular em Brasília, dedicando-se apenas
ao trabalho partidário, principalmente no Rio de Janeiro, onde morava.
Ou seja: Lupi passou seis anos recebendo dos cofres públicos para
cuidar exclusivamente dos interesses do partido de que hoje é
presidente licenciado. Para Vaccarezza, isso é perfeitamente normal,
porque a maior parte dos funcionários dos gabinetes dos deputados
jamais aparece em Brasília, já que trabalham nos escritórios políticos
nos Estados.

"A maioria (dos funcionários dos gabinetes) jamais pisou na Câmara.
Porque a maioria dos funcionários dos deputados fica nos Estados",
explicou candidamente o deputado Vaccarezza. E emendou: "Quem prova que
Lupi nunca apareceu para trabalhar? Por que o Lupi é fantasma? Porque
existe uma campanha contra ele". Certamente se referia ao "denuncismo"
orquestrado pelos inimigos do povo, que já obrigou Dilma Rousseff a
demitir cinco ministros envolvidos em negócios mal explicados.

O homem que lidera a bancada governista na Câmara dos deputados devia
saber que existe uma enorme diferença entre funcionário público, que
trabalha para o governo e por ele é pago, e funcionário de partido
político, entidade privada que, por isso mesmo, precisa assumir, ela
própria, os salários de seus colaboradores. E para sua subsistência
contam as agremiações com os recursos do Fundo Partidário, que pode ser
usado nos casos claramente definidos pela lei. O que não pode é
funcionário de legenda partidária receber diretamente dos cofres
públicos, como era o caso de Carlos Lupi quando exercia cargo de
natureza especial (CNE) no Parlamento.

Atualmente, o Regimento Interno da Câmara estabelece expressamente que
assessores CNE são obrigados a dar expediente na Casa. Foi uma medida
moralizadora adotada durante a gestão de Aldo Rebelo na presidência,
entre 2005 e 2007. "No caso do Lupi", afirmou Vaccarezza, "temos que
ver se a lei lhe dava permissão para trabalhar no Rio de Janeiro". Ou
seja, o próprio líder do governo não tem certeza sobre a situação do
ministro quando era funcionário CNE, mas não teve o menor
constrangimento em garantir que o ocorrido "é correto e legal, não tem
nenhum absurdo nisso". Já o presidente da Casa foi mais cauteloso,
explicando que será aberta sindicância para apurar os fatos: "Se for
constatada irregularidade, a Câmara pode pedir ressarcimento dos
pagamentos feitos". Ver para crer.

O mais extraordinário, no caso de um parlamentar, com a
responsabilidade de ser líder do governo, convalidar irregularidades no
trato da coisa pública, é que ele está falando a mais absoluta verdade.
De fato, boa parte, talvez a maioria, dos funcionários alocados nos
gabinetes parlamentares - isso vale também para o Senado Federal -
"jamais pisou" no Distrito Federal. Seus chefes garantirão, se
questionados, que esses servidores permanecem nos Estados cuidando de
questões relacionadas com as atividades legislativas; lá estão para dar
atenção aos cidadãos e encaminhar seus pleitos a seu representante no
Parlamento; que cumprem a generosa e patriótica missão de multiplicar a
capacidade de atendimento do deputado que, por ser um só, não consegue
estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Mas a descrição acima
corresponde às típicas tarefas de um cabo eleitoral.

Embora não se possa descartar a possibilidade de que um ou outro
abnegado funcionário dos gabinetes parlamentares de Brasília esteja em
seu próprio Estado fazendo apenas o que é certo de acordo com a lei e
os bons costumes, seria ingênuo supor que a maioria não é constituída
de cabos eleitorais, pelos quais pagamos todos nós. E há ainda outra
explicação para a existência de funcionários fantasmas da Câmara dos
Deputados espalhados por todo o País: nepotismo ou compadrio. Mas,
justiça seja feita, de nepotismo, até o momento, o ministro Lupi ainda
não foi acusado. --
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,pior-a-emenda-que-o-soneto,806428,0.htm


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