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De tão precisa e cartesiana, a teoria defendida pelo historiador Pablo Ortellado (Gpopai-USP) causa estranhamento. Durante o Simpósio Internacional de Políticas Públicas para Acervos Digitais, ele procura provar com números e relações/deduções inteligentes que o direito autoral não faria sentido no contexto da produção/consumo de livros no Brasil.
É simples de entender, na verdade. Para Ortellado, a "missão pública" do direito autoral foi subordinada aos interesses econômicos. "Com a tecnologia e a internet, temos a oportunidade histórica de colocar o direito autoral no seu lugar original, de promover a criação e o reembolso justo dos criadores", diz.
Acompanhe a argumentação:
- 70% do mercado de livros no Brasil é educacional (livros didáticos ou técnico-cientificos), visto que o país tem baixa taxa de leitura e alta taxa de analfabetismo. Por isso, a leitura se concentra em locais compulsórios, como escolas e universidades.
- Mas 85% dos estudantes comprometeriam toda a renda familiar se fossem adquirir os livros requeridos na bibliografia básica dos cursos por um ano.
- 30% da bibliografia utilizada nos cursos são livros esgotados no mercado. Portanto, os estudantes ou não têm o livro porque ele não está no mercado ou porque é caro.
- Nos últimos 10 anos, o número de vagas no ensino superior brasileiro aumentou 238%, mas a produção e venda de livros técnico-científicos ficou estagnada. Tradução: mais gente está na faculdade, depois de políticas de incentivo como o ProUni, mas os novos estudantes não podem comprar livros.
A presença do Estado neste setor é bastante significativa:
1 – paga salários a cientistas e financia a pesquisa
2 – dá imunidade tributária e incentivos a empresas editoras
3 – mantém editoras públicas, com recursos que seriam das universidades
4 – compra 30% do mercado editorial para distribuir os livros na rede pública de ensino
Sobre cada um dos pontos:
1- de 26% a 86% dos autores de livros estavam trabalhando em setor público com dedicação integral quando escreveram o livro. O livro foi um subproduto desses funcionários públicos, que faziam isso em horas vagas. Além disso, 92% do financiamento da pesquisa acadêmica no país tem origem em fundos públicos (agências de fomento à pesquisa científica). Conclusão: quase todos os conteúdos são fruto de investimento público direto.
2- A isenção do setor livreiro de impostos faz com que deixe de se arrecadar mais de R$ 1 bilhão, algo equivalente ao orçamento de todo o Ministério da Cultura.
3- As editoras públicas não têm um modelo de gestão em que algum lucro é previsto, para reinvestimento, como no caso da Petrobras. É tudo integralmente subsidiado pelo governo nesse cenário.
- Por isso, a conclusão: se há financiamento público maciço em toda a cadeia, por que falar em direito autoral? "É um salário duplo", afirma.
- Ainda mais pensando que a produção anual média no melhor departamento de sociologia do país (escolhido de propósito como modelo) é de apenas um livro completo publicado, fora alguas coletâneas de artigos. Média: dois capítulos por professor por ano. Salário do professor universitario: R$ 9.500 em média. Direito autoral sobre as obras produzidas: R$ 100. "É absolutamente irrelevante. Isso porque geralmente o professor nem recebe o direito autoral,, prefere receber em livros."
- Se é um setor altamente subsidiado pelos governos, como dizer que há prejuizo ao setor de livros com pirataria e xerox? A Associação Brasileira de Direitos Reprográficos (ABDR) divulga que 2 bilhões de cópias não autorizadas são feitas no Brasil por ano, o que gera R$ 400 milhões de prejuizo e R$ 60 milhões de impostos não arrecadados ao governo. "Mas essa pesquisa, se sequer foi feita, nunca é apresentada, divulgada de forma aberta, não se sabe a metodologia", diz Ortellado.
"Um setor com tanto subsídio precisa dar um retorno à sociedade. Precisa levar à sociedade o retorno e o interesse público da ciência, que está hoje subjugado ao interesse econômico dos direitos autorais", é a conclusão do professor Pablo Ortellado. Ele faz a afirmação final e é aplaudido.
Por Lucas Pretti
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