domingo, 26 de setembro de 2010

Pergunta e resposta

URL: http://gabinetesoninha.blogspot.com/2010/09/pergunta-e-resposta.html


Soninha, gostaria muito que respondesse a esse meu comentário. Meu voto pra presidente depende muito disso.

Assinei o feed de seu blog por um bom tempo, mas por falta de tempo tive que sair cortando várias das minhas leituras habituais que não fossem diretamente ligadas aos temas com que trabalho (área de tecnologia). E vale dizer que seguia seu blog, antes de mais nada, por admirar sua trajetória política, já que não sou de São Paulo e alguns dos temas que você trata às vezes estivam muito distantes de minha realidade, mais ainda assim, nos debates "mais universais" ler o seu blog sempre foi um prazer.

Pois bem, nessa eleição eu estava convicto que o meu voto deveria ir para o Serra.

Isso por admirar sua trajetória política e acadêmica (seus trabalhos em economia), a coerência dos seus discursos e suas atuações à frente do Ministério da Saúde, do governo do estado de São Paulo e da prefeitura da capital. Mesmo não morando em SP, busquei me informar bastante sobre as gestões locais do Serra, pois valorizo muito o meu voto, neste caso pra presidente.

A questão é que eu estava conversando com um amigo que irá votar na Dilma, e ele, que está longe de ser um militante ou algo do tipo, me mandou um link, que acabou por me deixar indeciso sobre uma opção de voto que parecia certa há tempos.

Eis o link: http://www.pt.org.br/portalpt/dados/bancoimg/100820164847Cartilha_REVISADA_FINAL_SITE_Layout_1.pdf

Sabia que link era do site do PT, e que isso tem grandes chances de gerar algo tendencioso, o que me levou a pesquisar alguns desses números em sites dos grandes jornais (Folha de S. Paul, Estadão, JB, Correio Brasiliense...) e todos os gráficos dos que eu vi estavam bem próximos do que o relatório do site PT mostrava, com algumas pequenas distorções, mas que não mudam a essência do resultado. Procurei por taxas de emprego, aumento do salário mínimo, balança comercial, avanços na educação, aumento dos investimentos em saúde, tamanho da dívida pública, volume de investimentos... e está tudo correto (como eu disse, com diferenças mínimas).

O caso é eu sempre encarei grande parte dos avanços do atual governo como uma continuidade de várias das conquistas do governo do Fernando Henrique. Mas olhando os gráficos mostrados nesse relatório (ao que parece, verdadeiro) o que se vê é que os avanços do Fernando Henrique vinham num determinado ritmo durante seus 8 anos de governo, mas ar partir do governo Lula houve saltos estrondosos. A maioria dos gráficos vem com uma linha de crescimento constante até 2002, mas a partir de 2003 sofrem uma enorme "aceleração" no seu crescimento, bem acima da linha contínua que vinha se desenhando no governo do PSDB.

A impressão que eu fiquei é que o governo do PT, mesmo que tenha feito muito das mesmas coisas que fez o governo do PSDB, fez quase tudo de forma mais eficiente, trazendo resultados bem melhores que o governo anterior, ainda que o governo anterior tenha tido resultados positivos.

Soninha, sei que você está envolvida na campanha do Serra, então gostaria de lhe pedir que por favor respondesse a esse meu comentário, com o porquê eu (e muitos eleitores, leitores do seu blog) deveriam manter o voto para presidente no PSDB, mesmo diante de números que dizem o governo feito pelo PT (ao menos em nível nacional) foi melhor.

Eu ficaria muito agradecido se você fizesse um post contestando esses números, ou postasse algum link de algum relatório parecido elaborado pelo PSDB, algo assim. Fiquei mesmo em dúvida sobre se é mesmo a melhor opção votar no Serra. Por confiar em você é que estou te pedindo isso, justamente porque não fico muito entusiasmado em recorrer a muitos blogueiros e militantes que estão sempre dispostos a uma guerrinha maniqueista, em que "o meu candidato é o máximo e o outro é uma porcaria". Confio e você.

Espero retorno. Um abraço e obrigado desde já.

Felipe S.

>>>>>>>>>>>>>>>>>>

Rapaz, é muita responsabilidade para uma resposta só :o)


Por partes:

Os números da cartilha do PT são, naturalmente, editados de modo a mostrar só o lado favorável.Sabe aquela coisa irreal da Física - "desprezando a lei da gravidade e a resistência do ar..."?

Você escolhe os dados que te interessam e bota lá...

Por exemplo, ao mostrar a comparação do salário mínimo com o dólar, ignora o fato de o câmbio estar bastante distorcido, com o real artificialmente valorizado. Se o dólar "vale menos", o salário mínimo, comparativamente, vale mais...

Fora isso, como acontece em outras áreas, alguns investimentos e conquistas são resultado de esforços locais - no Brasil, estados e municípios investem mais que o governo federal (que neste governo passou a gastar mais ainda com seu próprio sustento). Assim, se São Paulo e Minas, por exemplo, em políticas bem-sucedidas, geraram 2 milhões de empregos (tô chutando o número, mas foram os estados que se destacaram), o governo federal coloca tudo na sua fatura e diz "geramos 14 milhões"... Entende? E, de muitas maneiras, a política macroeconômica mais atrapalha a geração de empregos do que ajuda (com o tal do cambio, pra começar; a frouxidão da fiscalização alfandegária (não tô falando de turista com muamba, e sim de comércio com a China!); a taxa de juros e a carga tributária. Sem falar na burocracia e na corrupção... Que não são fenômenos apenas "federais", mas - convenhamos - muito presentes nesse governo.

Agora, existem mesmo resultados que são melhores agora do que antes. Mas os contextos são completamente diferentes. A crise do governo Fernando Henrique foi muito mais devastadora para as economias "emergentes" (sei lá como chamavam naquela época) do que a última. E se não tivéssemos tomado medidas duras e estabilizadoras na época, sabe lá onde estaríamos hoje. O PT - e eu dentro do PT - gritou horrores contra o PROER, como se deixar de socorrer os bancos fosse quebrar só os banqueiros... Que deixar o sistema ruir seria melhor para o país...

Passado aquele momento horrível, chegou o céu de brigadeiro. Pois bem, nesse período, o Brasil cresceu menos do que países "equivalentes", países em desenvolvimento. Ficou marcando passo, deixando de gerar riqueza para distribuir, amarrado à taxa de juros injustificavelmente alta. E distribuir não só no sistema de Bolsas, mas efetivamente permitir a mobilidade social, a redução da desigualdade. E aí está: o Brasil, mesmo com esse "sucesso" na política econômica, continua entre os DEZ MAIS DESIGUAIS do mundo.

Caramba, não era ISSO que a gente devia combater, mais do que tudo? A mobilidade social continua baixíssima. Por que? Ainda temos muitos milhões na pobreza absoluta ou extrema (dados do IPEA); ainda temos problemas graves na escolarização (uma proporção imensa de analfabetos ou analfabetos funcionais); ainda temos problemas inaceitáveis - ainda mais se o país vai tão bem... - em coisas como infraestrutura (de estradas e ferrovias à banda larga; da geração de energia limpa ao saneamento básico).

O país vive um momento de desindustrialização, o que é um retrocesso. Como o Serra costuma dizer, em outros países isso acontece em função de uma mudança no perfil econômico do país - e ele passa a ter uma participação maior do setor de serviços, por exemplo. Mas no Brasil não é o caso. Somos ainda - talvez sejamos sempre, por nossas características e tamanho - dependentes de uma indústria forte. Mas nos últimos anos retrocedemos para uma posição de fornecedores de matéria-prima... Exportamos celulose e compramos papel; a porcentagem de peças nacionais nos aviões da Embraer é men or agora do que era antes, e por aí vai.

Enfim, o país melhorou em parte porque havia a estabilidade anterior, em parte porque o cenário internacional até a crise dos EUA foi muito mais favorável, em parte porque muitos bens se tornaram muito mais baratos e acessíveis no mundo todo. Telefone já foi artigo de luxo (na época da telefonia estatal, então...); hoje é popularíssimo, e o governo Lula não tem quase nada a ver com isso... Se o povo tem mais facilidade para comprar DVD, microondas e TV de tela grande (pagando um juro escorchante no carnê), fica com a sensação de que tudo no mundo está melhor e por isso o governo é bom. Mas se falta esgoto tratado, meio ambiente equilibrado e estrada segura... Qual é o real mérito do governo??

E tem mais: além de eu não me satisfazer com os resultados – e o PT, se fosse oposição, estaria dando escândalo e falando da miséria, do analfabetismo, dos lucros recordes dos bancos – eu desaprovo completa e absolutamente os métodos. O discurso populista do presidente, a permissividade das relações com a base aliada, a tática de querer reescrever a história para dizer que tudo de bom que existe surgiu no governo Lula, que os governos anteriores não fizeram nada que prestasse... É um absurdo, um desrespeito. E justo o PT, que vive se queixando da "desconstrução do seu governo". A Marta diz isso em relação ao Serra, que não mudou o nome de um só programa que ela tenha criado, imagine... Manteve as marcas CEU, Telecentro, Bilhete Único... Já o PT, depois de esculhambar a política de Bolsas, lançou o Fome Zero - que sumiu de cena muito antes de chegar ao Zero... -e em 2006 resolveu juntar as Bolsas do governo anterior e chamar de Bolsa Família. E agora se refere ao Bolsa como se fosse invenção sua e pior, acusa "os poderosos" de querer acabar com ela!

Aliás, algo que me incomoda demais nesse governo é a demagogia. O discurso "nós gostamos dos pobres" X "eles gostam dos ricos". Mentiroso, desonesto. O presidente fala de si mesmo como se fosse um dos "pobres", um Davi contra os Golias, uma vítima dos "poderosos", das "elites". Como se não fosse, ele, um poderoso. O expoente máximo da elite política no Brasil (é o principal mandatário da nação há oito anos!). Aliado de oligarcas que tanto condenou... E ao mesmo tempo em que faz concessões como nunca admitiu fazer, ainda discursa como se fosse radical. Incorpora a direita em seu governo mas diz que a oposição é "a direita" ("raivosa"). Faz elogios ao capitalismo e discursa contra os capitalistas...

Ineficiência, corrupção, demagogia - ainda que realmente estivéssemos no melhor dos mundos do ponto de vista da Economia, essas três razões já seriam fortes o suficiente para que eu escolhesse outro candidato que não o do governo. Se eu ainda estivesse no PT - acreditando na possibilidade de mudar o partido por dentro - votaria... na Marina! Que também desistiu de fazer parte do governo e da legenda por que batalhou a vida toda; por que será?

Tenho mais pra dizer e podemos continuar conversando, mas por enquanto paro aqui. Desculpe a demora. Difícil conseguir para e escrever (quando o que se faz o dia todo é escrever, escrever, escrever :o))

Abs,S.

Nenhum comentário: